quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Gosto não se discute?



É comum a noção de que o gosto é pessoal e que, assim como política, religião e futebol, é um assunto que não deve ser trazido à tona para não suscitar discussões infrutíferas e que põem em risco as amizades. Isso ocorre porque quando manifestamos gosto por algo, seja um prato, uma bebida, uma obra de arte, ou qualquer outro objeto de nosso juízo, é porque esse objeto nos agrada, nos dá prazer de algum modo. Assim, os juízos a respeito do gosto estão centrados no estado de espírito do sujeito e não nas qualidades do objeto, conforme esclarece o filósofo inglês Roger Scruton em seu livro “Beleza”. Sob esse aspecto, realmente não há que discutir, pois
não podemos condenar ninguém por seu comprazimento diante de algo. Como diz o ditado: “o que é de gosto regala a vida”.

Entretanto, fazendo isso, estamos desconsiderando as qualidades do objeto. Não é porque alguém gosta de algo que isso torna justificável sua má qualidade. Por exemplo, muitas pessoas gostam de pornografia. Mas isso não faz desse tipo de material algo belo, ou mesmo aceitável, simplesmente porque “gosto não se discute”. Do mesmo modo, é inegável a superioridade musical de uma obra de Bach sobre um rap, ainda que muitos, hoje em dia, possam preferir esse último estilo. É como uma apreciação de vinho: existem critérios objetivos para definir um bom vinho, em detrimento de um vinho comum. Em geral, esses critérios dizem respeito ao quanto o vinho se aproxima de seu modelo ideal, dadas as características das uvas utilizadas, do tipo de fermentação, etc. Esses tipos de critérios existem para os vinhos, mas também para a música, para a literatura, para a gastronomia, a arquitetura...

Os filósofos de todos os tempos afirmam que também existe um modelo para o homem. E eles propõem a nós irmos ao encontro de esse modelo, pautado em critérios igualmente objetivos. Com base nesse aperfeiçoamento, podemos começar a gostar mais de nós mesmos e dos outros seres humanos. E a Filosofia em todos os tempos nos faz esse convite a dialogar – não discutir – sobre o que gostamos e como refinarmos nosso gosto e os nossos prazeres.

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